sábado, 31 de janeiro de 2009

(05) Lágrima-despedida

Com o peito arfante, Joanna seguiu em direção a sua casa, correndo. As duras palavras do soldado ainda ecoavam em seus ouvidos, e a sensação de estar desprotegida era estarrecedora. Correndo a passos sensivelmente maiores que suas pernas, a garota invadiu sua rua e mirou sua casa. Sua mente gritava por socorro, queria sentir-se segura, queria abrigar-se do medo.

Com um golpe certeiro, Joanna abriu a porta de uma vez e a bateu com força. E em um giro lento encostou-se na parede, onde foi escorregando lentamente até tocar o chão. E enfim, chorou. Lágrimas grossas varriam-lhe a face, arrastando consigo o gosto amargo e salgado de desesperar-se.

A menina não soube estimar quanto tempo passara ali, sentada. E apesar de seu corpo apresentar naquele instante um peso descomunal, levantou-se e observou janela a fora. Seus olhos arregalaram-se, e seus ouvidos sensibilizaram-se diante do baque pesado que se espalhava pela rua. Os soldados marchavam, e berravam com ira, batendo os pés e as armas no chão.

Seu coração vibrou ainda mais forte e determinado do que na livraria. O estrondo repetitivo determinava o ritmo, tudo naquele lugar pulsava. Joanna correu ao quarto de sua mãe, mas notando seu repouso pôs-se em silêncio, girando a maçaneta levemente e fechando o quarto à chave.

Com doces e trêmulos passos, a garota sentou-se ao lado da cama de sua mãe. Encostou devagar sua cabeça no colchão macio. Aos poucos, sua mente foi voltando pro lugar, e a sensação de segurança aqueceu se coração. A simples presença de sua mãe a fazia iluminar-se por dentro. Sua mão foi vagarosamente ao encontro da face daquele ser bondoso ao seu lado. Tocou-a.

Naquele instante suas pupilas dilataram-se a ponto de esconder a íris, e o sangue parou em suas veias. Ela estava gelada, assustadoramente gelada, e úmida. Seus músculos não respondiam, seu corpo petrificara-se, por completo. Uma dor aguda instalara-se em sua cabeça. O quarto rodava rapidamente diante de seus olhos, e o ar faltava-lhe nos pulmões. Seu corpo pendeu para o lado e Joanna permaneceu no chão, desacordada.

- Minha filha – Disse a voz paciente de sua mãe – Você vai precisar ser forte. É chegado o tempo, meu anjo, de seguir para o sem fim. Orgulho-me muito de você Joanna, do seu caráter, da sua fibra, da sua força de vontade. Meu tesouro, tenho que partir. Estarei sempre com você, quero que se lembre disso. E se precisar me encontrar, procure dentro de você, estou aí, em seu coração. Adeus Joanna.
- Nãaaaaaaaaaaaaao – Berrou Joanna em um grito rasgado. – Pelo amor de Deus mãe, nãaaaaao. Você é tudo que tenho. Não me deixa. Por Deus mãe, não me deixa.

O choro ininterrupto da garota abafou seus lamentos... Sua voz não se atrevia a dizer nada. Joanna era só escuridão por dentro. Agora, definitivamente estava só. Onde estariam seu pai e o Richard? Porque tanto sofrimento, porque tinha que ser assim? Seria tudo aquilo um pesadelo? Se o fosse, havia passado da hora de acordar.

A menina dos olhos castanho médio encontrava-se dilacerada ao lado do leito de sua mãe. A pele pálida, o olhar distante, a pulsação fraca. Adormecera ali. Rodeada por suas dores e prantos. Tocou novamente o corpo gélido de sua mãe na esperança de encontrar alguma fagulha de vida que lhe reacendesse a esperança.

Joanna ouviu batidas na porta da sala. Imaginou ser o soldado de outrora, mas dada a situação em que se encontrava, não havia mais nada que pudesse perder. A garota seguiu até a porta com um andar rastejante e fraco, e nem se quer se deu o trabalho de perguntar quem era. Em um movimento suave e cansado, abriu a porta.

Pela primeira vez naquele dia sentiu seu coração bater por algo que realmente a fazia feliz, era Hill, com seu típico ar de preocupação. E antes que ele pudesse perguntar alguma coisa, ela o abraçou. E encostando-se em seu peito, chorou. Um choro abafado, silencioso. Lágrimas brilhavam como pérolas no rosto apático da garota.

Ela o puxou pra dentro e fechou a porta. O silêncio da noite parecia música diante da carga de sentimento que habitava Joanna naquele instante. E abraçando-se fortemente a ele, a garota deixou a tristeza escorrer aos poucos, em gotas suaves e salgadas, que lhe brotavam dos olhos.


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Capítulo 04: http://loucurasredigidas.blogspot.com/2009/01/04-acontecimento-surpresa.html

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

(04) Acontecimento-surpresa

Naquele dia Joanna acordou um tanto assustada. Tivera um sonho ruim... Eram pessoas em meio a uma guerra, dentre eles, Richard. Porém, não estava sozinho, segurava no colo o corpo desfalecido de seu pai. Em seu sonho, seu irmão não apresentava mais claros olhos brilhantes, mas sim olhos chorosos e cansados. Os cabelos já não eram loiros e macios, e a pele já não era alva como a neve. Tudo parecia morto, seco, fúnebre.

Como não podia se demorar pensando naquilo, Joanna levantou um tanto atordoada e foi direto se vestir. Estava frio demais para pensar em tomar banho... Além de tudo, seu relógio já marcava algo perto das 8h, portanto, estava atrasada. Como não havia nada pra comer, saiu em jejum. E diferentemente do seu comportamento habitual, naquele dia ela não foi ao quarto de sua mãe para dar-lhe um beijo de bom dia.

Correu então até a livraria... A rua estava incomumente vazia naquela manhã, e as lojas estavam todas fechadas. Joanna estranhou o fato, mas preferiu abrir a livraria assim mesmo. Como não haviam clientes, começou a ensaiar algumas melodias no trompete. De vez em quando, o Hill ia até lá para ensaiarem, e chegaram até a tocar juntos pra alguns clientes.

Quase 2 horas se passaram, e ninguém apareceu... Resolveu então escrever ao Richard. O fato de não receber resposta alguma a intrigava muito. Talvez, as cartas enviadas por seu irmão tivessem com o endereço errado, e tenham retornado. Não queria pensar nisso, preferia pensar que suas cartas eram lidas com atenção, e certa dificuldade, por seu irmão em algum lugar.

“Richard,

Desculpe demorar tanto pra te escrever... É que as coisas estão difíceis pra mim. Estou trabalhando demais. Além de tudo, cuidar da mamãe piora um pouco as coisas. Ontem ela até estava melhor. Tinha nos lábios um sorriso pálido de dever cumprido, e me olhava como se sua consciência estivesse tranqüila. Às vezes penso em como seria se eu a perdesse, prefiro nem pensar, acho que enlouqueceria.

Estou ensaiando quase todos os dias com a clarineta, da próxima vez que nos virmos espero tocar pra você. Segundo o Hill, em pouco tempo estarei tocando bem o bastante para entrar no grupo de instrumentistas mulheres da divisão, mas não sei se estou pronta o bastante.

Por falar no Hill, nós estamos cada vez mais amigos Rich, na verdade, amigos demais. Esses dias ele acabou me beijando, e apesar de ter sido bom ele ficou rubro e foi embora. Talvez ele realmente goste de mim como a Nancy e a Sarah me dizem. Mas elas torcem pra que eu namore o Tom, já que somos amigos há bastante tempo. Não sei se namorar agora seria legal... Minha vida já está atribulada com as atividade que tenho e eu acho que...”

- Bom dia garota, por que abriu a livraria hoje? – Disse uma voz grave, que encheu a livraria e fez Joanna parar de escrever.

- Desculpe senhor, mas não entendo o porquê de não abri-la. – Respondeu a garota, timidamente.

- Acaso não sabes que dia é hoje? – Falou em tom bravio o soldado a sua frente.

- Desculpe-me senhor, é alguma data especial? Moro nessa cidade desde que nasci e não me lembro de ser data comemorativa. – Disse baixinho uma Joanna assustada, abraçando aos seus cadernos, devagar.

- Feche esse estabelecimento agora e vá para casa. Avise a todos os seus parentes para que não saiam. E isto é uma ordem. Qualquer pessoa nas ruas a partir das 14h será considerada como zombeteiro, e estará indo contra as leis do país. – Berrou heroicamente o soldado com seu olhar frio.

- Senhor, afinal, o que está havendo na cidade? Hoje é dia útil, não posso manter a livraria fechada e também...

- CALE A BOCA – Gritou o homem – Como ousa desobedecer às ordens do Exército? Escute aqui, garota atrevida, feche isso imediatamente e vá para casa. E não faça mais perguntas!


Os olhos frios do soldado haviam transformado-se em brasas ardentes a invadir a mente de Joanna. A garota não se conteve, e desabou no choro enquanto organizava tudo e se preparava pra fechar a loja. Seus pensamentos moviam-se intensamente entre lembranças de sua mãe acamada, seu irmão e seu pai, o Tom e o Hill, dentre outras coisas. Sentia medo, muito medo. Em gestos rápidos ela fechou a loja, segurando junto aos seios os cadernos onde escrevia suas cartas e poesias... E sem olhar pra trás ela correu para casa à longas passadas, deixando pra trás os homens dos olhos de brasa. Sua mente estava confusa, e Joanna temia que as coisas piorariam ainda mais.

“Por favor, ajude-me Richard... Onde quer que esteja, sei que pode me ouvir com seu coração.” – E as lágrimas rolavam amargas pelo rosto da garota. O medo era seu companheiro, e o desespero, seu capataz.


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Para quem não acompanhou os outros capitulos, aí vai o link do capitulo anterior.
http://loucurasredigidas.blogspot.com/2008/12/03-realidade-viva.html

Momentos...

Momentos...
"Mas aqueles anjos agora já se foram, depois que eu cresci"