quinta-feira, 19 de junho de 2008

Na manhã de inverno...

E que se fechem as cortinas, o espetáculo acabou. Não se vê mais palhaço, pipoca ou picadeiro. Não se vê mais senhoras nas varandas, não se ouvem mais cirandas. Não mais festejam o verão, nem se escondem no inverno. Não se nota solidão, não se nota, emoção, não se nota coração, não se nota nada. Não se brinca carnaval, não se une no natal, não se escolhe bem ou mal, não se faz mais nada. Não se vê mais passarada, nem se vê a criançada chegar rindo da escola.

E que se fechem as janelas, primavera já passou. Como passamos você e eu. Como passou a diversão, como viveu por tanto em vão, como vivemos você e eu. Mas o tempo não volta mais, não volta paz, não volta amar, não volta crescer. Porque o sonho acordou, e se viu velho no espelho. E nem mesmo as raras flores do inverno podem diminuir o frio, porque ele vem de dentro. Vem da lágrima que não desceu, do grito que se calou, do medo que se escondeu. Como escondemos você e eu, da chuva que cai sobre nós.

E que se fechem todas as portas, o sorriso envelheceu. A fotografia perdeu a cor, as ruas perderam a cor, os cabelos perderam a cor. Mas as águas de Março não fecharam o verão, nem promessas de vida no meu coração, nem pau, nem pedra, só o fim do caminho... E a flor que brotou já morreu, e o sonho que brotou já morreu, como também morremos você e eu. Porque quando perdemos o brilho no olhar, já não eramos nós, já não tinhamos voz, não desfizemos os nós, tão sós. E a solidão já não canta mais, já não brinca mais, já nem sai de casa... A solidão é nada. E nesta manhã o sol resolveu não nascer, mas a lua também não apareceu, assim como não aparecemos você e eu.

E que se apaguem as luzes, porquê a escuridão já é forte demais. E que a maré invada o cais, já que os dias são todos iguais. Nem mesmo os pombos suportam a praça vazia, não se ouve mais os ecos daquele dia, não se usa mais fantasia. E tanto faz, porque quando a luz se apagar, estarei sozinho outra vez... Mais uma vez. Como apagados ficamos, eu e você.

Mas quem sabe o espetáculo não começa outra vez, quando o inverno acabar...

Momentos...

Momentos...
"Mas aqueles anjos agora já se foram, depois que eu cresci"